15 November 2025
Por uma escola livre de "Inteligência Artificial"

Os humanos, em geral, não gostam de pensar intensamente. Uma análise recente envolvendo mais de 170 estudos em 29 países, e 358 tarefas distintas – desde aprender a usar tecnologia nova, à prática de tacadas de golf – permitiu concluir que em todos os casos as pessoas sentiam maior frustração e stress quando tinham de usar mais o cérebro. Quando dados a escolher, tanto ratos de laboratório como humanos escolhem tipicamente o caminho da menor resistência [1].

A adaptação é fundamental ao desenvolvimento cognitivo, mas nas últimas décadas tem-se imposto cada vez mais um modelo de ensino onde é dever do professor moldar-se ao aluno. E depois da escola, o Mundo adaptar-se-á ao indivíduo?

Em "A fábrica de cretinos digitais" [https://archive.ph/vB4EI], o neurocientista francês Michel Desmurget (PhD) revela, com base científica, que a geração Z (também conhecida como “nativos digitais”, nascidos entre 1997 e 2012) foi a primeira a ter um Quociente de Inteligência (QI) inferior ao dos pais, contrariando o "efeito Flynn" [https://archive.ph/SbDLL]. Essa tendência foi documentada em países onde os fatores socioeconómicos têm variado pouco, como a Noruega, Dinamarca, Finlândia, Holanda ou França [2]. Uma das principais causas dessa “descerebração” é o péssimo e abusivo uso da tecnologia, sendo que nem o facto de serem apelidados de “nativos digitais” os torna especialmente competentes em informática [2]. Um grupo de investigadores Canadianos estimou em 2022 que o excesso de tempo passado em frente a ecrãs durante o desenvolvimento cerebral aumentará, em fase adulta, o risco de demência relacionada com a doença de Alzheimer [3]. O antídoto contra o surgimento do “cretino digital” é, segundo Desmurget em "Ponham-nos a ler!" [https://archive.ph/wmu7d], a leitura por prazer. Nesse livro, a leitura surge como o sustentáculo que permite à criança desenvolver os três pilares da sua essência humana: aptidões intelectuais, competências emocionais e habilidades sociais.

A inteligência artificial (IA), uma área da ciência da computação com aplicações em diversas áreas do conhecimento, tem o potencial de melhorar e prolongar a vida do Homem, mas também de a destruir. Os maiores benefícios resultarão do seu emprego em investigação científica, permitindo por exemplo prever fenómenos climáticos, desastres naturais, ou antecipar o diagnóstico de doenças graves (e.g, cancro). Os maiores malefícios serão causados pela sua utilização massiva e quotidiana em tarefas tradicionalmente executadas exclusivamente pela inteligência e criatividade humanas. Para o médico e neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, a inteligência artificial que está em voga (a generativa) é uma ideologia de automação que visa o lucro infinito e o controlo social, não sendo (tal como qualquer outra IA) nem inteligente nem artificial. Nicolelis considera ainda que a delegação desmedida de funções cognitivas às máquinas terá consequências nefastas para o Homem [4].

The Karolinska Institute in Sweden recently published research concluding there's clear scientific evidence that tools impair rather than enhance learning. Sweden has taken note and been the 1st country to kick tech out of the classroom, reinvesting in books, paper and pens., Sophie Winkleman [5].

Entretanto em Portugal, e segundo a Agência Lusa [6],

O ministro da Educação, Ciência e Inovação afirmou esta quinta-feira que deverá ser apresentado em maio o programa que prevê que cada aluno tenha um tutor de Inteligência Artificial (IA), considerando que seria um erro não usar IA nas escolas.

(...)

Questionado sobre como será implementado este objetivo de dar a cada aluno um tutor, o ministro explicou que a ideia é “aproveitar aquilo que hoje a inteligência artificial dá”, já que o seu “não uso é o maior erro que qualquer pessoa, hoje, pode cometer“.

Sendo este o mesmo governo e ministro que tinham aprovado, no mesmo ano, o Decreto-Lei que regula a utilização no espaço escolar de equipamentos pessoais com acesso à internet (e.g, smartphones), proibindo o seu uso a todos os alunos até ao 6º ano [7].

Cabe-nos a todos e a cada um decidir como educar e ser educados. Votos de boas reflexões e de um santo Natal!

Tem a coragem de usar a tua própria inteligência, Immanuel Kant.

REFERÊNCIAS

1. Ford C (2025). The case for using your brain — even if AI can think for you, Vox [https://archive.ph/QQhS9].

2. Velasco IH (2020). “Geração digital”: por que, pela 1ª vez, filhos têm QI inferior ao dos pais, BBC [https://archive.ph/5iuIW].

3. Manwell LA, Tadros M, Ciccarelli TM, Eikelboom R (2022). Digital dementia in the internet generation: excessive screen time during brain development will increase the risk of Alzheimer’s disease and related dementias in adulthood, Journal of Integrative Neuroscience, doi: 10.31083/j.jin2101028 [https://archive.ph/Feywh].

4. Abambres M (2025). Tem a coragem de usar a tua própria inteligência, Blog xyz, Razão [razao.xyz/blog/tem-a-coragem-de-usar-a-tua-propria...].

5. Abambres M (2025). Renascimento da educação, Blog xyz, Razão [https://razao.xyz/blog/renascimento-da-educacao].

6. Agência Lusa (2025). Ministro da Educação considera erro não usar inteligência artificial nas escolas, Observador [https://archive.ph/PnvCe].

7. Governo da República Portuguesa (2025). Proibição de smartphones nas escolas diminui bullying e aumenta socialização dos alunos, Website do Governo de Portugal [https://archive.ph/oLLhV] [https://archive.ph/Fb8q7].

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  1. Miguel Abambres, Professor de Matemática, Engenharia e Computação, Independente (Razão), Lisboa